quarta-feira, março 11, 2009

23 de janeiro de 2008; por Daniel.

Acordei por volta das nove horas da manhã a fim de arrumar minha mala, pois tinha que pegar avião em São Paulo e nada meu estava pronto. Deixei o computador ligado e comecei a contar para as meninas do Sul que estava de partida naquela tarde e pedi para irem me buscar no aeroporto de Navegantes, final de tarde. Eram três meninas bobas, dando berros-virtuais por eu voltar, depois de dois meses em casa. Eu amava aquelas três.

Sempre fui meio nostálgico e apegado à emoções e estas me bateram ainda aquela manhã. Destino ou não, deixei à elas um depoimento caloroso, para dizer-lhes o quanto cada uma delas era importante pra mim e como eu amava elas. Finalizei, cada depoimento, com um pra sempre. Uma certeza minha. Era quase meio-dia quando escuto alvoroço na garagem, berrando pelo nome: Daniel, desça aqui!

Corri a toda, pois curiosidade sempre foi meu ponto fraco e, ao chegar na porta da cozinha, minha irmã mais nova tapou-me os olhos e guiou-me para a rua. Senti um tremor sem explicação nas pernas e meu coração batia acelerado, culpa da curiosidade que me dominava. Demos dez passos e ela me parou. Ouvi três vozes contando até três e destaparam meus olhos. À minha frente, estava um Vectra GT preto, com um enorme laço em volta dele. Meu pai entregou-me o documento do carro, no meu nome, e desejou-me um feliz natal atrasado. Eu dava gritos e gritos de alegria, corri para cancelar minha passagem e, depois de dois anos e meio, pude, enfim, ir de carro para Santa (e bela) Catarina. Era o fim das minhas viagens de Praiana ou carros alugados.

Voltei para cima, para contar a novidade às minhas três pupilas que aguardariam por mim aquela tarde. Disse que ganhara um carro, que não precisariam mais buscar-me no aeroporto e que chegaria mais tarde, pois não dependia mais de horário e poderia fazer minhas coisas com calma. Afinal, eu ganhara um carro, poderia fazer o meu horário e não depender da ocupação e disponibilidade dos outros. Estava realmente radiante com tudo aquilo.

Às cinco e pouco da tarde comecei a dar tchau para todos da família e deixei um bilhete pro pai, que nunca chega em casa antes das 19hras. Abracei apertado minha irmã e saí, brincando com a chave do carro na mão, fazendo malabares com ela e rindo, para a mãe e irmã, que estavam no portão. "Ligo quando chegar", eu disse.

A viagem até que estava tranqüila, se não fosse o temporal que caía sobre a cidade. A estrada era esburacada e a forte chuva dificultava a minha visibilidade, fazendo-me, vez ou outra, passar por cima de um dos milhares buracos que estavam a minha frente. Lembro que anoitecia rápido, para horário de verão, e logo uma trovoada se juntou com a forte chuva, tornando tudo mais caótico. Desviei de um buraco no instante que um raio clareou a estrada e peguei um buraco pior. O pneu estourou. O carro rodou. Capotou. E eu bati, num poste.

A pancada foi forte e eu sentia o cheiro adocicado do sangue, que me impedia de respirar. Tentei me mexer, mas foi em vão. Eu estava preso naquela lataria recém-nova. Esmagado, abraçando um poste. Lembrei do rosto da minha irmã ao desejar-me boa viagem e da aflição, leve, que correu por ele e lembrei daqueles três rostos que ansiavam o meu retorno. Lágrimas escorriam por minha face e eu ainda lutava por respirar, por sair dali. Havia vozes misturada com os trovões e estava escuro, muito, muito escuro. A dor cessava, depois voltava com mais intensidade e cessava de novo. Estava enlouquecendo. Porra, será que ninguém vai me tirar daqui? - era o que gritava, ou pensava estar gritando. Meu coração batia na cabeça, que doía. Ouvi sirenes. Barulho de metal serrado. Gritaria. Correria. E silêncio.

Minha vida acabara ali.

4 comentários:

  1. Nossa que post.
    Lindo e triste ao mesmo tempo.
    Bjo

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  2. Meu Deus, que coisa mais linda! Sempre pensei em fazer um texto assim, de morte, mas ainda não consegui. Tô vendo que o blog é ÓTIMO. Beijinhos.

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  3. Sou sempre a trasada!! Só agora li esse texto!! Começo a entener o propósito dos textos anteriores que tanto me fascinam e me prendem, pelo ar de "mistério e dúvida"... Acho q agora entendi!1

    bjuss!! Mesmo que triste.. Belo!

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